O Leitor, A Crise e o Quinto Círculo do Amor
Mônica Clemente
Kate Winslet e David Kross
O Leitor - Filme de Stephen Daldry baseado no livro de Bernhard Schlink
A Crise e o Quinto Círculo do Amor
Se você está
vivendo uma crise, ou ainda não a superou depois de tantos anos, talvez o livro
e o filme O Leitor possam ajudar, porque nesta obra se tenta lidar com o quinto
círculo do amor.
Coletivamente,
a crise se apresenta quando algo ainda não foi integrado, visto e legitimado
porque se excluiu um grupo e sua cultura, ou se negou a dimensão da natureza, a
vida de outros seres ou o tempo de mudança. Uma crise como guerras ou
catástrofes econômicas, por exemplo, se apresenta sem que possamos fazer mais
nada. Somos escolhidos para ficar de um ou do outro lado dos acontecimentos. Algozes
e vítimas, vivos e mortos, direita ou esquerda em guerra impõem em cada pessoa um
papel neste grande drama, até que uma percentagem apreenda algo e todos mudem o
paradigma vigente.
A isso,
damos o nome de Quinto Círculo do Amor, quando um movimento muito maior do que a
nossa vontade pessoal comanda o destino de uma geração. E chamamos de crise o
que acontece para que se olhe e integre o que ainda não foi visto ou aceito no
quinto círculo.
Pessoalmente,
a crise surge porque excluímos, ou não respeitamos as ordens ou o equilíbrio
entre as trocas no sistema familiar. Podem ser compensações transgeracionais em
busca de solução por quatro gerações, por exemplo. A crise vem para nos levar
aquilo que não olhávamos.
O Quinto
Círculo do Amor, então, não é a crise, mas ela está lá nesta dimensão acertando
as contas em nossas vidas, como um raio caído na cúpula de uma Torre.
Lembra-se da
carta do Tarot “A Torre”? Nesta imagem arquetípica duas pessoas nuas caem no
chão depois de um raio (crise) quebrar um encaixe redondo (Quinto Círculo) que
não cabe da edificação quadrada e rígida (nossa visão de mundo ultrapassada e
negadora da realidade). Tudo o que se construiu para viver não cabe no novo
horizonte ou no mundo de verdade. Assim o raio, embora seja doloroso como as
crises, liberta as duas pessoas nuas do que as aprisionou e impossibilitava de
se relacionar com o mundo real.
Por isso o
ideograma chinês da crise é composto de perigo e oportunidade. O perigo se
refere à queda e a oportunidade de que ela nos faça acordar. Como um pesadelo
nos acorda no meio da noite e diz: presta atenção nisso!
Neste artigo
vamos tentar ver como o Quinto Círculo do Amor aparece no filme o Leitor e como
a compreensão dele pode nos apoiar durante as crises. Mas antes vou explicar os
5 círculos, segundo as descobertas de Bert Hellinger:
Os Cinco Círculos do Amor
Bert
Hellinger observou nas Constelações que existem cinco círculos do amor:
1) Tomar a vida que vem dos pais, amorosamente.
Tomar o amor que os uniu até você. O primeiro círculo vem com a vida
que recebemos dos pais. Se passamos pela adoção ou outros adultos nos cuidam, reconhecemos,
incluímos e agradecemos os pais que deram a vida e os pais e adultos que a
mantiveram neste primeiro círculo, sem excluir nenhum deles. Muitos adultos
ficam presos neste círculo se houve separação precoce dos pais, ou se não
reconhecem o que custou à mãe e ao pai gerar a vida.
2) Reconhecer e receber dos pais todo o cuidado
que deram. O segundo círculo se estrutura com
o que recebemos deles para nos mantermos vivos e nos prepararmos para enfrentar
a vida, sem que isso precise ser perfeito, senão não poderíamos nos fortalecer
e expandir. Cada geração aprende com acertos e erros do passado. Desprezar
certos comportamentos dos pais é não reconhecer o que os esforços deles têm a
ver com a nossa melhora. Muitos adultos ficam presos nesta etapa sem conseguir
lembrar, reconhecer e agradecer tudo o que custou aos pais manter este círculo
porque acham que tinha que ter sido diferente. Sem reconhecer a força e
competências que construíram pelas faltas e acertos que ocorreram, almejando
outras competências que teriam se tivesse sido diferente.
3) Dar e tomar na relação de casal com o tomar
adequado. O Terceiro círculo é quando estamos prontos, de forma adulta, para
montar uma parceria e ter nossos filhos, carreira e serviço desinteressado, sem
esperar que nosso parceiro/a ou amigos, empregos, estado compensem as faltas emocionais
dos pais. Nesta fase arcamos com tudo o que implica se tornar adulto, inclusive
buscando ajuda para suprir o que faltou. Claro que em situações de
vulnerabilidade social, o Estado deve dar suporte para emancipar quem teve sua
juventude roubada.
4) Concordar com a família tal como ela é,
inclusive com os difamados e os excluídos. O quarto círculo
é aceitar nossa família e todos que pertencem a ela, sem julgar, sem excluir e
sem negar o que aconteceu. Não é se enganar de que o pai, avô ou bisavô não era
alcoólatra, por exemplo, mas é não excluí-lo por conta disso. Não é negar a
violência da mãe, avó ou bisavó, mas não excluí-la. Não sabemos o que levou
cada um para estes comportamentos. Então não os justificamos nem os julgamos
para aprendermos e ficarmos livres destes comportamentos.
5) Concordar com o mundo tal como ele é. O quinto
círculo, que nos interessa nesta análise, é o reconhecimento do mundo com ele
é, reconhecendo os limites de nossas ações para transformá-lo, assim como nossa
responsabilidade em sua transformação. A noção de que há movimentos coletivos
que escapam ao nosso controle e se impõem sobre todos. São mudanças de
paradigmas, por exemplo, quando uma nova ordem social surge e depois os
historiadores dão nome àquelas eras. São as guerras que tomam dois lados como
inimigos, mostrando ainda nossa incapacidade de vivermos juntos com as nossas
diferenças e as riquezas finitas do planeta. Como disse Bert Hellinger: “Isso diz respeito à capacidade de
reconciliação entre os povos, por exemplo. Este é o amor universal, que sabe
que somos movidos por poderes superiores. ”
O Leitor (tem spoiler)
O
Leitor é um livro premiado de Bernhard Schlink que em 2008 foi lançado como filme
homônimo dirigido por Stephen Daldry. Ele foi indicado à cinco categorias do
Oscar com a Kate Winslet vencendo o posto de melhor atriz no papel de Hanna.
A obra conta
a história de Michael e Hanna na Alemanha de 1958 até final do século XX. Michael,
um rapaz de 15 anos passa mal na rua e é salvo por uma cobradora de trem com o
dobro de sua idade, a Hanna. Ela o leva para sua casa, lhe dá banho e lava as suas
roupas. Depois de três meses de recuperação da escarlatina, ele retorna à casa
da mulher para agradecer. Daí em diante eles se apaixonam e um universo se abre
para cada um deles.
O
envolvimento se dá com a febril iniciação sexual do adolescente e as surpreendentes
reações da vulnerabilidade de Hanna, normalmente seca e objetiva, quando ele
fazia as leituras dramáticas de diversos clássicos da literatura para ela. Até
então, o jovem não sabia que tinha algum potencial ou valor, mas as diversas reações
de Hanna começam a despertar a autoestima do rapaz e amolecerem as defesas
daquela mulher misteriosa.
Em certo
momento ela desaparece deixando-o atordoado. Oito anos depois, Michael está na
faculdade de direito frequentando julgamentos como parte do currículo quando se
depara com ela no banco dos réus. Hanna, com outras mulheres, são acusadas de
terem deixado 300 mulheres judias morrerem queimadas em uma igreja em 1944, em
um evento conhecido como a Marcha da Morte, ocorrido durante a evacuação do
campo de Auschwitz, final da segunda guerra mundial.
Durante o julgamento
também é revelado que a acusada escolhia as meninas mais fracas ou doentes do
campo de extermínio para passar a noite com ela. As prisioneiras recebiam um
banho, um bom prato de comida e liam para Hanna. Exatamente o que ela fazia com
Michael, sem o desfecho sexual. Na manhã seguinte, eram enviadas para a câmera
de gás. Em certo momento, aquela mulher desconstruída em monstro, respondendo a
todas as perguntas com total honestidade, porque pareciam lógicas as suas ações
na guerra, pergunta ao promotor se ele também não obedeceria às ordens que lhe
eram imputadas. Ele não tem resposta.
Nesta parte do filme, as duas “Alemanhas”, a da
guerra e a derrotada do pós-guerra se confrontam. Uma é a culpada e monstruosa e
a outra inocente e sem suspeitas. Esta última pune os algozes como se eles não
fossem parte daquela nação. Aí nasce a obra prima do alemão Schlink e sua
tentativa de reconciliação com seu passado.
O autor coloca em cheque a monstruosidade e a
inocência da Alemanha, mostrando que algo maior os conduziu à Guerra, jogando
uns como os outros, escolhendo pessoas para serem algozes e pessoas para serem
vítimas. Não fez isso, no entanto, tirando a responsabilidade de cada um no
processo. Afinal, Michael, personagem que representa a Alemanha inocente está
com Hanna, a personagem que representa a Alemanha monstruosa, em cada poro do
seu ser. E Hanna o ama tanto quanto se permite receber algo.
As duas “Alemanhas” que buscam reconciliação
dentro de si, fazem amor e se amam neste filme por meio destas duas personagens.
Eles sofrem as mesmas dores de serem algozes e inocente, como Hanna e Michael,
porque aquela é a sua história. Será que aprenderiam com ela? Aprendemos com a
nossa história?
Voltando ao
enredo: o que finalmente condena Hanna à prisão perpétua é um documento
redigido e assinado, possivelmente por ela, contando o que aconteceu na noite
da morte das 300 prisioneiras. Ela afirma que não tinha sido ela, mas o nome
está lá. Naquele momento Michael descobre o segredo de sua antiga amante: ela
não sabia ler nem escrever, por isso pedia para ele ler para ela aqueles
clássicos. A vergonha fez ela confessar os crimes que cometeu e até o que não entendia,
confirmando que aquela assinatura no documento era dela.
O Quinto Círculo do Amor aparece nesta cena.
Não sabemos qual e como a onda nos pegou, mas fazemos um papel nela como vítima
ou algoz, ou qualquer outro papel para encaramos a crise que não víamos.
O estudante vai
à prisão para convencê-la a falar a verdade, o que diminuiria a sua pena, mas
desiste no caminho. Era muito jovem para digerir os acontecimentos. Alguns anos
se passam e Michael, com uma filha pequena, separado e sem conseguir se refazer
do que aconteceu entre ele e Hanna, (A Alemanha nova e a da Guerra) começa a
gravar os livros que ela gostava enviando-os para prisão. Com isso a
prisioneira decide a aprender a ler e a escrever. Só na cela, sozinha e despida de quem foi, ela pode começar seu
aprendizado. Como a crise faz com a gente.
Muitos anos
se passam ainda até o advogado receber uma ligação de que ela será posta em
liberdade e precisa de alguém do lado de fora daqueles muros (A Torre) para ajudá-la
a viver. Eles se reencontram, ela de cabeça branca, rugas e amor por Michael, e
ele cheio de expectativas, arrogância por sua inocência maculada e defesas.
- Você aprendeu
alguma coisa com a prisão, Hanna? Pergunta Michael referindo-se a qualquer
sentimento de arrependimento dela por ter feito o que fez. Hanna, de uma parte
da alma que precisava daquilo como o beduíno anseia por água no deserto, diz:
- Eu aprendi
a ler!
Os dois se
despedem. Ele arrasado, mas de certa forma feliz de montar um apartamento para
ela que, em sua cela, sobre em uma montanha de livros e se enforca.
Hanna deixa
um testamento para Ilana Mather, uma menina prisioneira do campo de
concentração que ela trabalhou. Assim, Michael fica incumbido de levar até uma
das vítimas do holocausto aquelas economias para serem doadas à alguma obra de
caridade do povo judeu. Ilana já com mais de 50 anos não aceita o dinheiro, mas
fica com a caixinha onde ele foi guardado, porque lembrava do único pertence
que pode levar para o campo de extermínio.
Neste
momento fica claro para os dois o quanto Hanna (a guerra) os marcou para sempre.
Michael pergunta se pode doar o dinheiro para uma instituição de alfabetização
e Ilana concorda. O filme termina com o advogado mais velho e pronto para
revelar tudo o que aconteceu para a sua filha, a próxima geração.
A Crise de Hanna e Michael no Quinto Círculo
do Amor
A obra
literária do alemão Schlinck vai expondo aos poucos as paixões e dores da
Alemanha pós-guerra, confrontando, por meio de suas personagens, a geração que
a promoveu e viveu, as suas vítimas e a nova Alemanha que olha para o passado
como se não fosse dela a herança das mãos sujas de sangue, ou não pudesse
seguir em frente aprendendo com o que aconteceu.
O julgamento
de Hanna e das outras criminosas é o cenário escolhido para mostrar a fronteira
entre o que é justo punir e o que não se pode personalizar em um movimento
coletivo como a Guerra. Embora cada um sente, arca e aprende algo pessoalmente
com o papel que desempenhou.
Hanna é
culpada de seus crimes e como ela, muita gente na Alemanha não tinha noção –
não sabia ler - do que estava acontecendo. Gente comum assinava embaixo dos
atos desumanos contra uma população, como se fosse lógico. Isto fica implícito
nas várias vezes que pediu para o adolescente Michael e as prisioneiras doentes
lerem para ela. Esta ignorância diante de outra vida, a mesma que toda tragédia
coletiva se apoia para atrocidade que comete, é representado pelo seu
analfabetismo em contato com a vulnerabilidade dos seus leitores.
Quanto tempo
mais ela ficaria cega para o que acontecia ao seu redor? Quanto tempo ficamos
cegos até uma crise nos abater?
Mas um dia,
depois de anos na prisão, ela aprendeu a ler. (Depois de anos em uma crise,
decidimos buscar ajuda). E não foi simplesmente
ler, não foi simplesmente entender a leitura, não foi tomar consciência dos
fatos pela leitura, foi mais do que isso.
Se não, Michael, a nova geração estava a salvo de cometer os mesmos
erros dos seus antepassados. (Estamos vendo isso aqui no Brasil, estamos
caminhando para repetir as mesmas atrocidades do passado porque ainda não
conseguimos apreender algo, juntos!).
Então o que
significa ser o Michael, o Leitor que fez Hanna aprender a ler?
O confronto
entre as gerações sem dizer “vocês são culpados e nós inocentes”. Porque o futuro
(Michael) já sabe sobre o passado, que quando era presente não sabia.
Assim,
juntos, podem olhar para o aconteceu e deixar aquilo atuar e os transformar. O
algoz em Hanna e a nova e inocente Alemanha em Michael, fazem amor para
aprenderem juntos. Não aprenderão apontando o dedo um para a outro, como se não
pertencessem ao mesmo drama – O quinto Círculo do Amor – que os tomou como
personagens para aprenderem algo JUNTOS.
Então, a
leitura em si não traz nova consciência e assim faz mudanças. Quantas pessoas
já tomaram consciência de que o cigarro faz mal à saúde e continuam a fumar?
Minha
hipótese, se olho para o filme pela perspectiva do Quinto Círculo do Amor, é de
que o leitor e a leitura (do mundo) só existem porque houve confrontos
terríveis que possibilitaram aos dois ver o que não se via. Aqui a capacidade
humana de ver o mundo por tantas lentes (leitor de mundos) e de tantas as
formas terríveis e maravilhosas (as leituras) pode acontecer tanto como uma boa
educação, se há um espaço privilegiado para isto acontecer: o confronto amoroso do passado com o que nasceu
dele.
É o
confronto de diferentes olhares e vivências e não a tomada de consciência que
nos fazem leitores do mundo como Hanna se tornou. A alma dela tinha sede de
algo que não era possível só tomando consciência. Por isso Hanna escutava e
escutava as mesmas histórias de suas vítimas e da nova geração em Michael, e se
emocionava sempre com elas até aprender ela mesma a ler e a escrever. Ela não
tomou consciência de algo, ela incorporou um pedaço do mundo que estava lá
fora, tão distante que se podia matar sem ter noção de que o outro existia de
fato. A leitura para Hanna nasce depois de ser a algoz que se confrontou com
todos a quem feriu. A nova geração que lia ganhou da velha geração a
compreensão de mundo. Compreensão impossível para a velha geração naquela época
sombria.
O livro de
Schlink é uma tentativa de redenção entre estas gerações. Não tem a pretensão
de perdoar os algozes ou reafirmar as atrocidades polarizando vítimas e
perpetradores, como mostra a cena de Ilana recusando a doação de Hanna. Este ato diz “que fique claro que houve
crimes hediondos e não há nada que mude isso”. Ao mesmo tempo, ela guarda a
caixinha que lembrava a sua infância e que é da sua Algoz que se suicidou, ao
lado da foto da família morta nos campos de concentração.
Mortos descansam
lado a lado, igualados.
Nesta cena
está a solução. Como Hellinger falou, a paz começa quando olhamos os mortos
(dos dois lados da guerra) com amor. Veja aqui.
Neste
sentido, quando uma força maior nos conduz à destinos coletivos (para que
possamos aprender algo com ele e ultrapassá-lo para uma nova ordem mundial), vítimas
e algozes precisam estar na mesma lágrima de dor, por terem sido pegos pela
onda do tempo. E isso exige demais da vítima.
E sim, os
algozes terão também que despertar como Hanna despertou. Não só pessoas “do
bem”, mas todos terão que virar leitores e isso leva tempo e confrontos e
crises. Ou seja, repetiremos, inconscientes, várias vezes estas ondas, que
tentam espantas as crises, até que uma massa crítica possa incorporar soluções mais
inclusivas.
E como Schlink
tentou a reconciliação dos algozes com a sua culpa? Com o amor entre Michael e
Hanna e o efeito de cada um sobre o outro. Michael não desiste dela mesmo
sabendo o que ela fez. Ela o ama, mesmo sem saber o que ela fez.
Também não
acho que ela se enforcou sobre os livros porque tomou consciência, graças a
leitura, do mal que fez. Que solução há em pagar com o sangue do algoz o sangue
derramado da vítima? Nenhum passo para
frente.
Embora ela
tenha escolhido este fim, e temos que respeitar os suicidas, porque há algo de
coletivo conduzindo estas almas, interpreto ela subindo nos livros para se
matar como o fim do fascismo nela. Um exorcismo. Numa crise, uma parte nossa também
morre. Ela responde à pergunta de Michael “você se arrependeu do que fez? ” com
“eu aprendi a ler”. O que antes era tão
distante agora faz parte dela. É de alteridade e sua radicalidade que o livro fala.
A radicalidade da alteridade é reconhecer que há o totalmente outro que não se pode
reduzir aos desejos pessoais ou à violência ou à nossa ignorância.
Aprender a
ler para ela é o fim do que a levou a fazer o que fez. Ela está livre, e não
porque está morta, mas porque aprendeu a ler – aprendeu a alteridade naquele
confronto brutal criado na esfera do Quinto Círculo do Amor.
A
reconciliação do algoz com seus atos sabe que o passado não será diferente do
que foi, mas pode ser a base para novas soluções. Quem erra pode ter novas
chances? Os erros podem ser usados para futuros acertos? As crises são
oportunidades para fazer os acertos que não tiveram lugar no passado? O que
morre na crise e o que pode nascer e ser incluído?
Quem olha
para guerra ou para as crises e se fixa nos inimigos e vítimas ou na culpa e na
vingança, perde o caminho da solução. Ilana a personagem que representa todos
os perseguidos da segunda Guerra mundial, não se fixou, foi além.
E Hanna
acabou com o algoz em si porque nela os dois, vítima e perpetrador estavam
juntos e não mais separados nas trincheiras da guerra. A solução para as crises pessoais está no "juntos" - integrar o que faltava.
Por que esta conclusão? Porque
além da doação que queria fazer para as vítimas, em sua cela vazia Michel vê
escrito com a letra da ex-amante morta um trecho do livro “A Dama do
Cachorrinho” de Anton Chekov. Uma das obras que ela mais gostava. Este conto fala
do amor que existe entre um homem e uma mulher, mas pode ou não fazer os
amantes ficarem juntos, porque é mediado por situações externas incontroláveis.
Na cela fazia da prisioneira tem um conto de amor. O amante lê aquilo e sabe que a antiga Alemanha agora está integrada nele também.
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