14) A Coragem Moral em Antígona e Katharine Gun



Paulo Autran (Creonte) e Caclida Becker (Antígona), Teatro Brasileiro de Comédia 1952


Neste texto, abordarei Antígona, filha do casamento incestuoso de Édipo e Jocasta, como aquilo que une, não importa as desavenças. E o que Hellinger chamou de a Ordem do Pertencimento na Consciência Inconsciente Coletiva (2000: 62). Por exemplo: alguém exclui um de seus familiares, mas a alma da família o reintegra, impondo a um inocente, da próxima geração, o mesmo destino do excluído.  


Na tragédia de Sófocles, 442 a.C., Antígona, o foco é a luta de poderes sendo desafiada pela coragem moral da personagem principal. Antígona luta para que um de seus irmãos, Polinice, seja enterrado, ao invés de ser largado, com desonra, no campo de batalha. Ele havia lutado contra o outro irmão, Etéocles, morto também, na guerra pelo trono. Antígona entende os motivos dos dois, e não o faz apenas por amor, mas para não irritar os deuses, o que traria desgraça ao seu povo. A atuação dos Deuses nas tragédias se parece com a ação da Consciência Coletiva na Constelação Familiar. Creonte, tio deles, agora Rei de Tebas, não cede aos apelos da sobrinha, que decide enterrar o irmão, independente da pena de morte.

Em 2003, a inglesa Katharine Gun[i], vaza um e-mail da Agência de Inteligência Britânica, no qual há uma negociação fraudulenta para que os EUA pudessem declarar guerra contra o Iraque. Katharine, para defender seu grupo de colegas do trabalho, confessa o vazamento, mas não se declara culpada no tribunal, uma vez que seu objetivo era defender milhares de inocentes, o que, infelizmente, não aconteceu. Assim, a sua defesa força a liberação dos documentos que a inocentariam. Em 30 minutos de julgamento, a promotoria retira a acusação para não mostrar as ilegalidades.

Como em Antígona, Katharine luta pelos dois “irmãos” (países que seriam destruídos), desfia um poder maior que o seu, não consegue evitar a guerra (Antígona não enterra o irmão), e milhares de pessoas morreram (como Antígona, o amor fraternal, sofre a pena de morte). 


Jung disse que “os mitos são revelações originais da psique pré-consciente, afirmação involuntárias sobre acontecimentos psíquicos" (1990: 261). Com os mitos acessamos os aprendizados e erros do passado, podendo usá-los como plataforma de repetições ou de evolução.




[i] Tem um filme baseado nesta história chamado Segredos Oficiais, com Keira Knightley e Ralph Fines


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